O mundo do esporte acordou com a notícia trágica do falecimento do jogador Diogo Jota e seu irmão. E no meio de toda essa dor, um detalhe médico chamou a atenção e gerou muitas dúvidas: ele estava fazendo uma viagem de 20 horas de carro porque um pneumotórax o impedia de voar. Mas… o que é isso, afinal? Como uma condição no pulmão pode proibir alguém de entrar em um avião e, indiretamente, ter um papel em uma história com um desfecho tão triste?
Então, se você, assim como eu, ficou com essa pulga atrás da orelha, vem comigo. Vamos usar esse momento não para focar na tragédia, mas para transformá-la em conhecimento. Para entender o que é pneumotórax, por que ele acontece e o que ele realmente significa para o nosso corpo.

O que é pneumotórax, explicado de um jeito simples
Vamos direto ao ponto. Imagine que seu pulmão é como uma bexiga. Para essa bexiga encher e esvaziar (respirar), ela precisa de um espaço só dela, bem vedado, chamado de cavidade pleural. É um espaço quase virtual, com uma fina camada de líquido que permite que o pulmão deslize suavemente enquanto se expande.
Agora, o que acontece se você furar essa “caixa” vedada? O ar de fora entra.
E é exatamente isso que é o pneumotórax. É a presença de ar nesse espaço entre o pulmão e a parede do tórax. Esse ar que não deveria estar ali começa a pressionar o pulmão por fora, fazendo com que ele “murche” ou sofra um colapso. Total ou parcial.
Pensa de novo na bexiga. É como se o ar vazasse para fora dela, mas ainda dentro de uma caixa, espremendo-a até ela não conseguir mais encher direito. Assustador, né? E o resultado é uma dor súbita e uma falta de ar intensa.
Os diferentes rostos do pneumotórax
E a história fica ainda mais complexa, porque não existe um tipo só de pneumotórax. Entender isso é crucial.
- Pneumotórax Espontâneo Primário: Esse é o tipo que pega a gente de surpresa. Acontece “do nada” em pessoas sem nenhuma doença pulmonar conhecida. É mais comum em homens jovens, altos e magros. Acredita-se que pequenas bolhas de ar (blebs) na superfície do pulmão possam se romper. Já pensou? Você está vivendo sua vida e, de repente, sente uma pontada aguda no peito.
- Pneumotórax Espontâneo Secundário: Aqui, a causa é uma doença pulmonar já existente. DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica), asma, tuberculose, fibrose cística… todas elas podem fragilizar o pulmão e facilitar o vazamento de ar.
- Pneumotórax Traumático: Esse é o mais óbvio. É causado por um trauma, uma lesão no peito. Pode ser por uma costela fraturada, um acidente de carro, uma facada ou até mesmo por procedimentos médicos, como uma biópsia de pulmão. É o que vemos com frequência nos prontos-socorros.
A primeira vez que vi um caso grave no plantão, um rapaz jovem que caiu de moto, a imagem do raio-X era chocante. Um dos pulmões estava completamente “amassado” no canto da imagem, e o resto era só ar. Naquele momento, você entende que o conhecimento teórico precisa virar ação imediata.

Por que Diogo Jota não podia voar? A ciência por trás da decisão
Essa é a pergunta de milhões, e a resposta é pura física. A American Thoracic Society explica isso de forma bem clara. A pressão do ar dentro da cabine de um avião é menor do que a pressão ao nível do mar. É como se você estivesse no topo de uma montanha de uns 2.500 metros.
Para nós, com pulmões saudáveis, o corpo se adapta. Mas para alguém com um pneumotórax, a história é outra.
Lembra do ar que vazou para a cavidade pleural? De acordo com a Lei de Boyle (lembra das aulas de física?), que diz que o volume de um gás aumenta quando a pressão diminui, aquele ar aprisionado no tórax do paciente iria se expandir durante o voo.
Essa expansão aumentaria a pressão sobre o pulmão já colapsado e sobre o coração. O resultado? Uma piora gravíssima do quadro, podendo levar a um pneumotórax hipertensivo – uma emergência médica absoluta que pode ser fatal em minutos. A recomendação médica de evitar o voo não foi um capricho; foi uma medida para salvar a vida dele.
Como o tratamento do quadro realmente funciona
O tratamento vai depender do tamanho do colapso e da gravidade dos sintomas.
- Observação: Se for um pneumotórax pequeno e o paciente estiver estável, às vezes o corpo consegue reabsorver aquele ar sozinho. O médico pode optar por apenas observar, com oxigênio e repouso.
- Drenagem Torácica: Esse é o procedimento mais comum e o que provavelmente foi feito no caso do jogador. Um dreno (um tubo de plástico) é inserido no tórax, entre as costelas, para sugar o ar para fora e permitir que o pulmão reexpanda. É um alívio quase imediato para a falta de ar. O dreno fica conectado a um selo d’água, um sistema que impede o ar de voltar para dentro.
- Cirurgia: Em casos de pneumotórax recorrente, quando o “vazamento” não fecha sozinho, ou em casos mais graves, a cirurgia pode ser necessária. O objetivo é “remendar” o pulmão e, muitas vezes, fazer com que as pleuras (as membranas) grudem uma na outra (procedimento chamado de pleurodese), para evitar que aquilo aconteça de novo.
O que fica de lição é a importância de ouvir os sinais do nosso corpo. Uma dor súbita no peito e falta de ar nunca, jamais, devem ser ignoradas. E, claro, seguir as recomendações médicas à risca. A jornada de carro de Diogo Jota, embora exaustiva, era a única opção segura.
Que possamos levar não só a memória do atleta, mas também o conhecimento que essa situação nos trouxe. E que nós, como Azoners e profissionais ou estudantes da saúde, estejamos sempre atentos, pois o conhecimento, literalmente, salva vidas.
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Referências:
- G1. (2025). Morte de Diogo Jota: tratamento de pneumotórax levou jogador a encarar viagem de 20h de carro para Inglaterra, diz fisioterapeuta.
- Mayo Clinic. (2023). Pneumothorax – Symptoms and causes.
- American Thoracic Society. (2022). Patient Education | Information Series: Pneumothorax.
- Johnson, D. H. (2021). Spontaneous Pneumothorax. The New England Journal of Medicine.