Hoje o papo é sobre um tema que, olha… despenca nas provas de Pediatria (tá no top 10, acredite) e é o pão de cada dia no consultório, no postinho, no pronto-socorro: aleitamento materno.
Sei que às vezes a gente estuda tanto a teoria que esquece da prática, da conversa, do “olho no olho”. A ideia aqui é justamente essa: descomplicar o assunto como se estivéssemos trocando uma ideia no corredor do hospital, conectando a técnica com a realidade. Vamos desvendar juntos o que realmente importa?
Tipos de aleitamento materno
Então, pra começar, a gente precisa falar a mesma língua. A OMS define uns termos que as bancas adoram usar pra fazer pegadinha. É simples, olha só:
- Exclusivo: É só leite materno. Nada mais. Nem água, nem chazinho da vovó. Só peito ou leite ordenhado da própria mãe. A recomendação é que seja assim até os 6 meses.
- Predominante: Aqui o bebê recebe leite materno, mas também pode tomar água ou outras bebidas à base de água, como um suco de fruta. O que não pode é outro tipo de leite.
- Complementado: É quando a criança já come. Recebe leite materno e também qualquer alimento sólido ou semissólido.
- Misto (ou Parcial): É o peito mais outro tipo de leite, como uma fórmula infantil.
Pegou a diferença? É sutil, mas saber isso já te livra de muita cilada em questão de prova.
Os benefícios do aleitamento materno para a mãe e o bebê
Ok, todo mundo fala que amamentar é importante. Mas por quê, na prática? Isso aqui não é só pra prova, é argumento pra vida, pra orientar uma mãe com segurança.
Para o bebê, a lista de benefícios é gigante:
- Literalmente evita mortes infantis.
- É uma bomba de proteção contra diarreia e infecções respiratórias.
- Diminui o risco de alergias, hipertensão, colesterol alto e diabetes no futuro.
- Até o risco de obesidade lá na frente diminui.
- E sim, existem estudos que mostram um efeito positivo na inteligência e no desenvolvimento da boca.
E para a mãe? Não é só vínculo afetivo, não. Amamentar ajuda a proteger contra o câncer de mama, de ovário e de útero. Ajuda a evitar uma nova gravidez (como método contraceptivo natural, com ressalvas, claro) e ainda representa um alívio financeiro enorme. É bom pra todo mundo.
A fisiologia do aleitamento materno (sem complicação)
Mas o que faz essa máquina de produção de leite funcionar? É mais simples do que parece. A resposta está na sucção do bebê.
Pensa comigo: a maior parte do leite é produzida durante a mamada. Não é um estoque que fica lá parado. O estímulo da sucção libera dois hormônios chave:
- Prolactina: É a chefe da produção.
- Ocitocina: É a responsável pela ejeção, o famoso reflexo de “descida” do leite.
Prolactina produz. Ocitocina ejeta. Gravou? Esse é o mantra.
É por isso que a amamentação em livre demanda, sem horários fixos, funciona tão bem. Quanto mais o bebê mama e esvazia o peito, mais o corpo entende que precisa produzir. Bombas de ordenha ajudam, mas nada substitui a eficiência da sucção do bebê.
A técnica correta de aleitamento materno (que resolve 90% dos problemas)
Aqui está o pulo do gato. Muitas vezes, uma mãe chega desesperada, achando que tem “leite fraco” ou “pouco leite”, quando na verdade o problema é só a técnica. Antes de pensar em complementar, a gente precisa ser o detetive da mamada.
Como checar o posicionamento e a pega:
- Posicionamento: O corpo do bebê tem que estar colado no da mãe, e a cabeça e o tronco alinhados (sem pescoço torcido). O rosto do bebê fica de frente para a mama.
- Pega correta (a famosa pega assimétrica):
- A boca tem que estar bem aberta, tipo um “bocão de peixe”.
- O lábio de baixo virado para fora.
- O queixo encostando na mama.
- Dica de ouro: Você deve ver mais da aréola acima da boca do bebê do que abaixo.
Se você notar a bochecha do bebê afundando, ouvir estalos da língua ou a mãe sentir dor… alerta vermelho! A técnica provavelmente está errada e precisa de ajuste.
E sobre o ganho de peso? Calma. É normal o recém-nascido perder até 10% do peso nos primeiros dias. Ele deve recuperar o peso de nascimento entre o 7º e o 10º dia de vida. A média de ganho de peso no primeiro trimestre é de uns 30g por dia. Tenha esses números em mente!
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Problemas comuns no aleitamento materno (o “troubleshooting”)
Mesmo com a técnica certa, às vezes aparecem uns perrengues. Os mais comuns são mastite e ingurgitamento, e as provas adoram confundir os dois.
- Ingurgitamento mamário: É a mama “empedrada”. Fica cheia, edemaciada, brilhante e dolorida porque o leite não está saindo direito. O tratamento é esvaziar! Massagem, ordenha manual antes da mamada e mamadas frequentes resolvem.
- Mastite: É um passo além. É uma inflamação que pode virar infecção. A mãe sente um nódulo doloroso, mal-estar, calafrios e febre. O tratamento também envolve esvaziar a mama, mas aqui entra o antibiótico. E a mãe pode e deve continuar amamentando!
- Fissuras e traumas: Geralmente são culpa da pega incorreta. A orientação é corrigir a técnica, começar a mamar pelo seio menos machucado e, se possível, deixar os mamilos secarem ao ar livre.
- Candidíase mamária: Causa uma dor em “agulhada” que persiste após a mamada. O tratamento é com antifúngico para a mãe e para o bebê (que geralmente tem o “sapinho” na boca).
As raras contraindicações ao aleitamento materno
Confesso que, no início da faculdade, eu tinha medo de decorar essa lista. Mas a verdade é que as contraindicações absolutas são pouquíssimas. É isso que você precisa levar pra vida.
O aleitamento materno está contraindicado em pouquíssimas situações:
- Mães vivendo com HIV ou HTLV1/2.
- Bebês com galactosemia, uma doença metabólica rara.
- Uso de medicamentos incompatíveis, como alguns quimioterápicos, radiofármacos e drogas de abuso (cocaína, heroína, etc.).
E as outras doenças? Hepatite B? Pode, desde que o bebê receba a vacina e a imunoglobulina ao nascer. Hepatite C? Pode, só precisa cuidar para não ter fissuras. Tuberculose? Pode, com a mãe usando máscara. Até COVID-19 não é contraindicação!
Colostro, leite de transição e leite maduro
Você sabia que o leite materno muda de composição?
- Colostro (até o 5º-7º dia): É a “primeira vacina” do bebê. É um líquido mais amarelado, produzido em pequena quantidade, mas é uma bomba de proteínas e fatores imunológicos (como a IgA secretória). Tem menos gordura e calorias que o leite maduro.
- Leite de Transição (até a 2ª semana): Como o nome diz, é a ponte entre o colostro e o leite maduro.
- Leite Maduro: É o leite “final”. Mais rico em gorduras e lactose. E ele também muda durante a mesma mamada: o leite anterior (do começo) é mais rico em água, para matar a sede, e o leite posterior (do final) é mais rico em gordura, para saciar e ajudar no ganho de peso. Por isso a importância de esvaziar bem uma mama antes de oferecer a outra.
E comparado ao leite de vaca? A principal diferença, que você não pode esquecer, é o tipo de proteína. O leite materno é rico em lactoalbumina, que é de fácil digestão. O leite de vaca é rico em caseína, que é pesada e de difícil digestão para o estômago do bebê, além de ter um excesso de minerais que sobrecarrega os rins.
Ufa! É bastante coisa, né? Mas tentei organizar de um jeito que faça mais sentido na prática. A jornada do aleitamento materno é cheia de desafios, e nosso papel como futuros médicos e como Azoners é ter a informação correta e, principalmente, a sensibilidade para acolher e orientar.
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